Leia gratuitamente o capítulo 1 de “Anota, vai que esquece?” – Síndrome de Burnout
Capítulo 1 – Buguei
(todos os direitos reservados)
Despertei com o barulho do freio de mão. Eu havia parado o carro. E estava bem perto do meu local de trabalho. Olhei ao redor e tentei lembrar como eu tinha chegado até ali. Estava com a mesma sensação de acordar de repente depois de ter dormido por horas dentro de um ônibus de viagem. Sensação de alma fora do lugar.
Continuei sentada tentando refazer a linha do tempo daquela manhã. Desliguei o rádio. Procurei alguma pista em minha bolsa e encontrei um bilhete manuscrito: “comprar o bolo da Jesa” e um comprovante de pagamento do posto de gasolina. Lembrei que havia me comprometido a comprar um bolo para uma colega de trabalho, que fazia aniversário naquele dia. Estava estranhamente petrificada, travada para aquilo.
Peguei minha bolsa. Tranquei o carro e fui subindo em direção à rádio, onde trabalhava. Veio-me à mente a cena de ter de voltar ao posto de gasolina naquela manhã, por ter esquecido de pegar o cartão com o frentista. Daquele momento em diante, minhas lembranças se tornaram um quarto escuro.
Só recordo de estar ouvindo músicas em inglês, enquanto dirigia da Zona Sul até a Zona Oeste de São Paulo, com muito congestionamento. Eu não me lembro de ter parado em algum semáforo. Estava no modo piloto automático e não tinha a menor ideia se havia acontecido algo no trajeto. No carro, não havia sinais de batida, amassados ou qualquer avaria. Nada nos pneus.
Quando cheguei ao trabalho, ainda vasculhando a memória, meu chefe questionou a respeito do bolo e de um atraso de quase duas horas.
– Não sei o que aconteceu, tive uma espécie de apagão e não consigo lembrar de nada! – respondi.
Minhas palavras saíram com o esforço de quem busca respostas. Ele não entendeu o que eu disse e supôs que eu havia me atrasado propositalmente.
Informou ainda que teria passado por mim em um determinado trecho do percurso e que já havia chegado há mais de meia hora.
– Não consigo lembrar o que aconteceu…
Fui interrompida por uma bronca e colocada de “castigo” – “por ter inventado uma história”. Uma semana sem poder entrar no ar em qualquer um dos programas.
Meu chefe podia ter dito para que eu procurasse um médico ou que eu fosse aconselhada por um dos pastores da Igreja, já que eu trabalhava numa rádio dentro de uma instituição religiosa. Talvez pudessem ter percebido que eu estava bugada, com algum problema. Nos bastidores daquele lugar, onde o lema era amor e cuidado com vidas, a dinâmica era bem diferente com os funcionários.
Fiquei sentada diante do computador, tentando entender e forçar minha memória… Nada! Nem consegui trabalhar, nem lembrar.
Chamei uma amiga psicóloga no Whatsapp e contei a ela o que estava acontecendo. “Está com cara de ser estresse. Há quanto tempo você não tira férias?”
A última eu havia tirado há mais de seis meses e foi apenas de cinco dias. E durante minha ausência “de corpo”, fui solicitada, na rádio, por telefone e redes sociais. Não consegui desligar do trabalho.
Ainda mais depois que meu chefe discutiu comigo por telefone, por uma banda que havia confirmado presença em um dos programas da grade e não apareceu.
– “Quando você voltar, conversamos”, ele enfatizou.
Quem descansa com um barulho desses? Mesmo assim, ainda pensava que o apagão pudesse ser reflexo de uma noite mal dormida.
Só que era Burn out. Síndrome de Burnout.
Este foi o diagnóstico que recebi nos primeiros dias de setembro de 2016.
Meses antes eu podia dizer que era feliz. Divorciada, mãe de três filhos, trabalhando com o que amo – locução e produção de rádio – e muito envolvida com “minha igreja”.
Tinha minha semana toda comprometida e sentia prazer em cada atividade que fazia, em ser útil, em servir. Trabalhava na rádio em horário comercial e minhas noites eram todas com atividades na igreja: estudos, célula, cultos e grupos de apoio a dependentes, codependentes e compulsivos.
Era muito corrido, mas eu amava estar lá, ajudando, servindo, sendo útil. Eu amava trabalhar na rádio da igreja, embora a cada dia me sentisse mais e mais exausta.
Isto me leva a um assunto bastante indigesto.
Enquanto me sentia plena e realizada, por acreditar que estava vivendo “no centro da vontade de Deus”, ao trabalhar na obra, experienciar a palavra de Deus o dia todo, por passar meus finais de semana em congressos evangélicos… por outro lado, em casa, eu era ausente e extremamente ditadora.
Os congressos, cursos e eventos da igreja local e da sede eram todos pagos; por ser obreira da congregação eu era obrigada a participar “para dar exemplo”. Meu salário, na rádio, era abaixo do piso da categoria e eu pagava quatro ingressos para participar, já que ia com meus filhos. Era muito puxado, fora os custos de combustível e alimentação. Eu era dizimista e ofertante. Todo mês, dez por cento do meu salário retornava ao meu empregador, fora as ofertas em todos os cultos, já que havia um apelo forte neste sentido.
Em meu último ano de rádio, minha situação financeira estava tão complicada que, constrangida, pedi ingressos gratuitos para dois eventos aos quais não poderia faltar. Ninguém podia saber, para que não pedissem gratuidade. A igreja enriquecia e os funcionários empobreciam.
Em meio a um congresso de cinco dias, tive meu carro roubado nas proximidades da igreja, porque não conseguia mais pagar o estacionamento mensal. E de “caroneira”, passei a ser aquela que precisava de carona. Eu e meus filhos chegamos a sair da sede da igreja mais de dez da noite e voltar de trem para casa, algumas vezes, porque todos os carros estavam cheios.
O meu pastor e sua esposa tinham um carro de oito lugares; um dia nos deu carona para voltar da sede, porque eu disse que ia desistir do curso. Na semana seguinte, deu desculpas.
Ele voltava com o carro 50% vazio e nós, de trem, metrô, trólebus e ônibus. Isso quando não perdíamos o último 23 e o trecho era a pé ou de táxi. Eu acordava seis horas, trabalhava o dia todo e depois ia para o curso. Era exaustivo chegar em casa uma hora da manhã e dormir pouco.
A cobrança era cada vez maior: Se você não aprende a visão da igreja, como pode falar em nome da denominação, na rádio? Era preciso decorar e repetir as palavras do líder da igreja.
Ele dizia que músicas não-evangélicas eram satanistas, exibia videoclipes, no telão da igreja, espalhando medo e culpa na mente das pessoas.
“Não ouça músicas, não assista filmes que não sejam cristãos, não veja a Globo, não leia livros, consuma somente nosso material, ouça sobre teorias da conspiração, nova ordem mundial, Foro de São Paulo. Lula, Xuxa e Kate Perry fizeram sacrifício humano. Não coma em restaurantes de macumbeiros, você será contaminado. Não visite as igrejas X, Y e Z, eles estão longe da vontade de Deus”. Era esse o discurso do curso para líderes: alienação e manipulação.
Éramos massacrados e obrigados a seguir uma linha muito rígida. Qualquer deslize podia custar meu emprego. Discordar do pastor, líder ou apóstolo era ser taxado de rebelde, de ter parte com satanás. “Deus não se agrada”.
Enquanto isso em casa, eu reproduzia a doutrina do medo, censurando programas de TV (ainda que simples desenhos animados), e toda forma de cultura adolescente. O Samuca fazia desenhos e desenvolvia jogos e ao invés de elogiar e apoiar… Eu morria de medo da igreja saber que dentro de casa tinha “coisas de demônio”. Foram brigas e mais brigas, porque me fizeram acreditar que aquilo trazia maldição para minha casa. Eu cheguei a apagar uma pasta inteira de material dele.
Eu estava na coleira eclesiástica e prendia meus filhos em uma grade de pecado, maldição, culpa e autoritarismo. Descobri há pouco tempo que o nome disso é ABUSO ESPIRITUAL.
“Abuso espiritual é o uso impróprio de qualquer posição de poder, liderança, ou influência para satisfazer os desejos egoístas de um líder. Às vezes o abuso se origina em posições doutrinárias. Às vezes ele ocorre porque os interesses pessoais de um líder, ainda que legítimos, sejam satisfeitos de maneira ilegítima. Sistemas religiosos espiritualmente abusivos são comumente descritos como legalistas, controladores mentais, religiosamente viciadores, e autoritários.” (teologaroficial.com.br)
“O abuso espiritual poderia ser definido como o encontro entre uma pessoa fraca e uma forte, em que a forte usa o nome de Deus para influenciar a fraca e levá-la a tomar decisões que acabam por diminuí-la física, material, espiritual ou emocionalmente”, (secrai.com.br)
O pastor local repetia sempre, no púlpito, que havia se convertido aos doze anos, casou-se virgem com a primeira namorada, constituiu a família perfeita, era pastor exemplo de conduta dentro de uma denominação que sempre crescia, graças a sua obediência a Deus e seus líderes.
Ele, por meio de seu discurso, obrigava a todos os fiéis a abrirem seus segredos e não decidirem nada – de casamento a viagem, faculdade – sem seu aval. Pessoas esperavam meses para falar com o pastor, por medo de fazerem algo “errado”.
Quando eu disse ao meu pastor que havia uma chance de ser enviada a outro lugar, no futuro, para pastorear, ele riu e desdenhou. Afirmou que meu chamado era na rádio e apenas isso. Quando disse que estava apaixonada por uma pessoa de outra igreja, ele torceu o nariz. Ele queria que eu casasse com uma pessoa da nossa igreja.
Quando apresentei meu “pretendente”, o pastor disse com todas as letras: – “Sempre tenho problemas com pessoas da Igreja Batista. Será que terei problemas com você?”. E o discurso seguiu de forma igualmente desagradável e inconveniente, quando questionou os motivos do casamento dele não ter dado certo. Ignorou o fato dele ser teólogo, evangelista e membro de uma mesma igreja havia anos. Tratou um homem de mais de quarenta anos como um moleque.
Foi tamanha a perseguição, que ele sofreu um A.V.C e teve uma crise depressiva da qual se trata até hoje. E os culpados nunca foram responsabilizados, porque são representantes de Deus, na terra.
Ed René Kivitz, uma pessoa bastante criticada nas aulas do curso de líderes (mas ovacionado em público, em pleno exercício de falsidade do líder-mor da sede), falou sobre paternalismo, quando os adultos passam a ser tratados como crianças e os líderes agem fora de sua esfera de autoridade:
–“Muitos líderes começam a dar ordens às pessoas como se elas não fossem mais adultas; ‘você não vai se casar com esta pessoa! ’, ‘você precisa mudar de casa!’. A autoridade pastoral não pode descer ao detalhamento da vida pessoal: Com quem vou casar? Que proposta de emprego devo aceitar? Devo vender minha casa e comprar um apartamento?”. Isso está fora do campo de autoridade pastoral, porque esse campo é teológico e ético. – “Posso descrever para você o que a Bíblia diz sobre como deve ser o caráter do homem com quem você vai se casar. Mas é você quem vai ter de decidir à luz desses critérios”. O que passar disso, diz Kivitz, configura abuso. E foi este abuso, que eles chamaram de amor e cuidado, que me custou a família e a saúde.
Como se tudo isso não fosse suficiente, houve muito estresse na rádio neste ano.
A esposa do meu chefe, uma mulher incrível e doce, que trabalhou na rádio por muitos anos, engravidou de trigêmeos.
Pelas condições da gestação de alto risco dela, seu marido passou a se ausentar do trabalho para acompanha-la em consultas e muitas rotinas de trabalho dele acabaram sob minha responsabilidade.
Concomitantemente, vivi tempos de muito stress com a Jesa, aquela garota do trabalho. Teoricamente, exercíamos a mesma função, mas ela era meio desorganizada e eu costumava ser a responsável por arrumar a bagunça. Então somou o cansaço físico, mental e bum!
Burn out, do inglês, queimar, apagar. Síndrome de Burnout trata-se de um estado de esgotamento físico e mental, cuja causa está intimamente ligada à vida profissional.
Entre os sintomas estão: crise de ansiedade, dificuldade em exercer duas atividades ao mesmo tempo, maior facilidade em tomar sustos, falta de apetite, emotividade exacerbada e, em um segundo momento, crises de pânico resultantes de situações de pressão, além de apagões – como se o meu sistema operacional mental entrasse em tela azul do Windows.
Travamento. Eu fazia algo e não lembrava. E isso me gerava mais estresse e ansiedade, que agravava meu quadro.
Não sei dizer quando essa situação começou, mas minha mente cansou. Bugou. E eu não notei. Achava que era cansaço, que precisava de férias.
As pessoas não tem problema com Deus, e sim com seus representantes, aqueles que dizem seguir o homem símbolo do amor e da empatia distribuem julgamentos e exclusão.
Trabalhar dentro de uma igreja, eu imaginava sorrisos e palavras amorosas todos os dias. Era assim que eu me esforçava para ser: amorosa e otimista. Pessoas são pessoas. Não existe um aplicativo de perfeição que se instala em quem serve na igreja. Tem gente injusta, mentirosa, procrastinadora. Assim como há no banco, no supermercado.
Eu acreditava que estava ali trabalhando “para Deus”, ainda que com salário abaixo ao valor de mercado e uma jornada sempre maior do que a estipulada e tarefas que se multiplicavam. A rádio precisava estar redonda. “É para Deus”, nada pode falhar, nada pode ser feito relaxadamente. Se alguém não conseguia fazer sua parte, eu fazia. Eu não me permitia errar. Eles não me permitiam errar. O peso de acusação e a culpa eram enormes.
Eu fui me cansando, me esgotando… e não me dei conta disso.
Naquela manhã, meu chefe me repreendeu:
– “Você está atrasada em mais de uma hora. E cadê o bolo do aniversário da Jesa que você ficou de comprar?” – ele foi curto e grosso.
– Estive na loja, não comprei o bolo por não lembrar. Eu não sei o que aconteceu.
Ao invés de me orientar a procurar um médico, afinal ele sabia do meu comprometimento com tudo, meu “castigo” foi ficar uma semana sem entrar no ar. Era assim que as coisas funcionavam, na base da punição, como criança.
Em outra oportunidade, tomei uma bronca no lugar da Jesa, por uma tarefa que era dela e me cobraram como se eu fosse a responsável. Eu disse que não era comigo. Meu chefe não estava e a pessoa queria que eu respondesse por ele. Fiquei com tanta raiva, que dei um soco na cadeira. Fui chamada na sala de aconselhamento pastoral e não lembrava o soco na cadeira. O Burnout causa lapsos de memória.
A Jesa disse que eu devia estar tomando algum remédio tarja preta para emagrecer e por isso estava descompensada. E isso bastou para que ninguém me estendesse a mão na rádio. Não me orientaram a pedir ajuda, vinham apenas castigos e punições. E eu não estava tomando remédio algum, estava perdendo peso por não sentir fome. Incrível como a maldade sempre encontra diversos ouvidos.
Passei a ter constantes dores de cabeça, gripes e até hemorragias. Nada me acendeu a luz vermelha de que eu precisava me cuidar.
Em uma escala de zero a dez, eu estava no nível oito de uma doença quase desconhecida por mim, havia apenas na literatura em inglês e quem me indicou foi uma psicóloga da própria igreja que um dia participou de um dos programas.
E bastou uma situação de pressão extrema em que meus nervos, mente e corpo foram levados ao limite, explico melhor mais adiante, e o gatilho foi disparado: Síndrome do Pânico. Lapsos de memória, ausências, medo, angústia, isolamento, falta de vontade de tudo.
Senti uma culpa enorme por estar daquele jeito. Como aconteceu comigo que sou cristã, uma mulher de fé? E eu trabalhava na rádio da igreja. Abria o microfone todos os dias para falar de esperança, fé e otimismo. Senti-me uma fraude, uma farsa. Como podia falar de cura para as pessoas se eu estava doente?
Veio o processo de perda, de abandono. Mesmo aparentemente vivendo uma vida normal, estava cada vez mais dentro da concha das culpas e falhas. Desistindo, abrindo mão.
Houve dias em que não consegui sair de casa para trabalhar, as crises de pânico eram diárias e quando estava mais grave, fazia tudo home office. Fugia das reuniões de amigos, festas e eventos sociais. Não queria que vissem como eu estava. E quem eu contava que pudesse me ajudar, não sabia como. Não houve uma empatia real.
Na verdade ninguém do meu convívio sabia como ajudar. E os que podiam ajudar não deram a devida importância. Perdi o apetite, a alegria, a criatividade (que é o dínamo da minha profissão) e me apoiei no silêncio.
Minha família foi de extrema sensibilidade nesse processo. Vi-os desesperados muitas vezes, mas sempre me sustentando em amor.
Calei-me. Não queria vitimismo. Não queria enfraquecer a fé dos outros. E a minha visão dos fatos estava contaminada pelo Transtorno do Pânico. E foi nessa solidão que decidi sair do emaranhado de emoções e racionalizar o que estava acontecendo. Mergulhei na psicologia, algo que viria a me tirar daquele estado. Como se eu precisasse ajudar outra pessoa (não a mim) quis entender tudo a respeito. Sem espiritualizar nada.
Descobri que há um processo químico por trás da depressão, do pânico, Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e outros. Os remédios são receitados para reequilíbrio. E precisava confiar em alguém, colocar para fora todos os brejos que eu havia engolido, sapo por sapo. Devia abandonar as malas pesadas da culpa e aprender a dizer não. Pessoas são falhas e limitadas, a começar por mim. E não há nenhum mal nisso.
Apaixonei-me pela psicologia e passei a levar o curso a sério. Eu fui minha primeira terapeuta, quando sentei para escrever. Esse livro nasceu de uma busca desesperada por mim mesma, para me resgatar. Foi escrito com muitas lágrimas, lenços de papel e xícaras de chá feitas por minha filha caçula, a Liv.
Busquei me entender sem julgamento. Eu me amei de novo. Eu me permiti ser cuidada e curada.
Precisei mudar de ambiente, mudar de trabalho. Precisei me libertar do que me sufocava. Foi um parto a fórceps abrir mão daquilo que me dava aparente segurança, mas que, na verdade, me fazia mal. A zona de conforto é castradora e as relações tóxicas são viciantes.
Renasci. Perdoei pessoas e me perdoei. Rompi com o que me desgastava. Tornei-me mais sensível as pessoas ao meu redor. Desacelerei o ritmo. Passei a me respeitar. Aprendi a não julgar, mas amar. Resiliência e empatia não são só palavras.
Fui ao subsolo do fundo do poço. Hoje vivo tempos de voos altos.
Faço o que amo e tenho tempo de qualidade, minha vida espiritual nunca esteve tão boa, bem longe de igrejas e de pessoas decidindo o que é bom para mim. Vivo em paz. Feridas se tornaram cicatrizes. Sei que fui curada para curar.
Há quem sinta vergonha de expor suas crises de ansiedade, depressão, pânico, etc. E tem gente que não acredita, pensa que a pessoa tem de ficar despenteada e de pijama em casa, quando alguma dessas enfermidades se manifesta. É como ter hipoglicemia, dor de cabeça. A crise vem de repente. Não escolhe local, nem avisa. Chega chegando. Nem sempre vai acontecer com um pote de sorvete no congelador ou em um ambiente propício para esperar passar.
Engraçado encontrar uma foto perdida nas pastas do computador depois de quase dois anos. Fiquei olhando para ela vários minutos e, aos poucos, as lembranças desse dia foram desfragmentando. Eu estava na rádio, no estúdio do ar, três da tarde, no comando de um dos programas que mais amava fazer. Se não me engano foi meu último, mas nunca poderia imaginar que seria… Rimos muito com os convidados. Foi divertido. Naquele dia eu havia passado por uma crise de ansiedade punk ao acordar. Meu estômago parecia o iceberg que afundou o Titanic. Eu sentia dor em cada centímetro do corpo. Lembro que não consegui almoçar e nem o cappuccino maravilhoso da Cafeteria Michelina, meu preferido, que havia pedido de manhã tinha dado conta de terminar. Ele jazia gelado em minha mesa.
O programa começaria três da tarde e, às duas horas, tive outra crise. Sozinha, sentada na produção da rádio. Uma pessoa viu, duas viram. Preferi me fechar no banheiro e chorar muito. Tinha medo de não conseguir conduzir o programa. Sentia-me tão fraca e impotente! Chorei e me maquiei, coloquei generosas camadas de base e BB Cream para esconder as olheiras e o nariz vermelho.
O BB Cream é um corretivo usado para dar um acabamento uniforme e atenuar todas as imperfeições da pele. Se você é homem: Ele faz no rosto o que a massa fina faz na parede. Olhei para aquele reflexo no espelho e disse: Eu consigo! Eu consigo!
E consegui. Segurei duas horas de programa ao vivo, fiz piadinhas, dei várias risadas e ninguém notou que eu estava muito mal. Eu tremia inteira, como se estivesse com frio.
Meu estômago tinha espasmos de tempos em tempos e meu coração trabalhando no acelera, desacelera. Tudo isso acontecendo e eu focada no tema, controlando o andamento do programa, participações de ouvintes e nas minhas pernas que não paravam de tremer.
Quando saí do ar, parecia que eu havia corrido a São Silvestre. Estava exausta. Voltei para a produção, me escondi debaixo do fone de ouvido.
Naquele dia, me senti fraca e incapaz. Hoje vejo que fui forte. Enfrentei o Burnout, a ansiedade e a síndrome do pânico trabalhando.
Travei aquela luta com uma força, que nem imaginei que tinha. Sozinha, dentro de uma igreja com mais de sessenta funcionários. Uns frágeis demais para me ajudar, outros ocupados demais, outros importantes demais.
Eu fui forte, corajosa. Fui uma guerreira. Mulherão. Olhando para essa foto, hoje, posso dizer que vivi naquele dia o “Tudo posso Naquele que me fortalece”, que tantas vezes repeti.
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Ivete Oliveira
Sinto muito , por vc ter vivido tudo isso , mas graças a Deus muita coisa mudou , a igreja está mais leve agora , as pessoas podem estar pesadas ainda , principalmente a jesa que não aprendeu quase nada , coitada … mas graças a Deus a salvação é individual, é muita coisa aconteceu para mostrar que , pessoas tem o seu valor …
Fernanda Veiga
Obrigada!